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31/08/2022

63 - LEGITIMIDADE E CONFORMAÇÃO DA IMPUTAÇÃO PRELIMINAR NO MODELO CONSTITUCIONAL DE PROCESSO PENAL

Dissertação apresentada à banca examinadora junto à Universidade Federal de Minas Gerais, Programa de PósGraduação em Direito, como requisito parcial para obtenção da titulação de mestre em Processo Penal, sob a orientação do Professor Doutor Felipe Martins Pinto. 


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 RESUMO

O presente estudo analisa a imputação criminal que recai sobre o indivíduo, sujeito à persecução penal, ainda na fase preliminar da instrução. A imputação preliminar é estudada em seus fundamentos, natureza jurídica e repercussões. Os instrumentos normativos que, em regra, delegam o exercício do poder-dever de imputação preliminar às autoridades policiais são examinados. A partir da atual sistemática, discorre-se sobre a autonomia da imputação preliminar entregue à polícia judiciária, propondo-se uma mudança de orientação, com a exclusiva delegação de atribuição da imputação preliminar ao Ministério Público, legítimo titular da opinio delicti. Para tanto, adota-se como parâmetro o modelo processual penal italiano da indagine preliminare, sobre o qual é realizado breve estudo. A verdade sobre a qual se sustenta a imputação preliminar, baseada em evidências, é criticada, sob várias perspectivas, demonstrando sua fragilidade. Discorre-se, ainda, sobre a concessão de medidas cautelares e assecuratórias, a partir da verdade advinda da instrução preliminar, com efeitos danosos ao investigado e, por vezes, irreversíveis, sem o balizamento defensivo. Durante a pesquisa, o instituto da imputação preliminar é visitado sob o prisma do garantismo penal, tendo como paradigma o Processo Penal Constitucional. Sob este enfoque, a imputação preliminar passa a ocupar posição proeminente na instrução, como mecanismo de restrição a injustificáveis exceções aos direitos fundamentais da pessoa sujeita à investigação e de transparência da situação jurídica do indivíduo submetido à persecução. A justa imputação preliminar é apresentada como condição obrigatória para a concessão de medidas restritivas de direitos fundamentais durante a instrução preliminar. Aborda-se, pormenorizadamente, o indiciamento, ato formal de exteriorização da imputação preliminar, discorrendo sobre sua incipiente normatividade e sobre a atual e indevida tendência de potencialização dos seus efeitos em prejuízo do investigado.

62 - PAI AUSENTE

a um amigo que se tornou, apesar da falta.

Meus sentimentos.


Ontem morreu uma ausência

Pesada, repleta de substância

Insubmissa, este vácuo me suga

Querendo mais que tenho dado

Este buraco veio a mim desde a infância

E me tornou pela falta

E puxou todo o meu preenchimento

Num ciclo constante e severo.

Agora a ausência se foi, morreu

Irremediavelmente

Não cabe mais a tentativa de 

Não cabe mais o meu avesso

Ele, enterrado, a sete palmos

Vem seguir sua sina 


@johnnysio


61 - POEMA PARA REELS

Pára

A dancinha

Que um livro te espera

 

Sara

Desta compulsão que te devora

Como uma fera

 

Reels, shorts, trends e pedra

Aqui nada é além de uma rápida queima

Onde só o seu tempo se entrega

 

Se é num livro que repousa a calma dos olhos

Leve seus olhos para um lugar calmo como um livro

 

Agora


Veja o vídeo

 

 

29/08/2022

60 - MADEIXA URBANA

 

Pouco para contar. Apenas discutíamos o sequestro diário de nosso recato, ou como melhor diria Nélson Rodrigues, “o túmulo do pudor”, o ônibus apinhado. Sim!, todos os dias são pernas que se abespinham, línguas em diagonal, caretas impossíveis e uma sacola repleta de mau-humor.

Tudo acontece em pouca distância e muito tempo em nossa velha conhecida, a vetusta e malquerida condução. Não há exemplo maior de ineficiência do que o transporte público brasileiro das grandes cidades.

27/08/2022

52 - CIDADE JARDIM

Sou de Belo Horizonte

E deslizo sobre estas ruas a maior parte de meus dias.

 

É sobre elas que disfarço algumas frustrações

Fingindo-me apenas um carro em movimento

 

26/08/2022

51 - COLEÇÕES DE INFÂNCIA

A formiga é um brinquedo

Que corre e captura pedaços da minha infância

 

Sou dono de todas as formigas daquela avenida 


25/08/2022

50 - TODOS OS BICHOS

 


Pedro decidiu que possui todos os bichos da natureza, inclusive os de verdade, aqui em casa. Acontece que esta decisão trouxe para a família algumas situações embaraçosas.

Como entrar, por exemplo, com todos eles no elevador?

- Apertam com o chifre os botões do painel, óbvio. E para abrir a porta, usam as orelhas – respondeu o menino.

E todos os bichos moram dentro do apartamento, então, até os maiores e pescoçudos.

24/08/2022

49 - INSETO

 

O marimbondo morreu

E nada ao redor foi ferrão
ou movimento
Nenhum zumbido foi o que ficou

Lembro que as asas batiam
Caindo ciscos

Sua cor cobre fazia ameaças aos olhos

Havia um prego ou tiro sobre a minha nuca
E também uma leveza que não foi possível

Havia um inseto que era o instante,
O ponteiro e um dedo em riste.


O inseto era frágil demais para suportar

Isso foi antes de o marimbondo acabar

 

23/08/2022

48 - OLHOS ABERTOS

         O seu olhar melhora o meu

Arnaldo Antunes

 


Preciso de roupas, rápido. Por isto busco o personagem de um conto meu antigo (
Relato sob o outono), e suas vestes sem cor e a paisagem de madrugada, folhas secas e brisa persistente. Olho firme para a figura que criei e vejo que desenhá-la tenha sido talvez um alento de buscar um canto sem olhos, onde os movimentos são apenas os de qualquer moinho. Estar ali no co(a)nto, seria estar sozinho.

Até que ponto?

22/08/2022

47 - BALAIO DE DIREITOS


Direito à herança, a todos os centavos sem o sorriso dele, o toque forte e seguro, o bigode já grisalho de tanta entrega.

A todos os centavos, sem sua graça e força, sem a presença junto aos bichos, junto à gente. Sem a graça de seu sorriso, o toque e a voz rouca. 

Seu sorriso puxava a gente para a alegria que não monetiza. Não foi monetário, este perdulário de alegrias.

Direito aos centavos que restam depois dessa imensa perda. Incalculável é esta dor inflacionária, absurda. 

O código civil não é do mundo da dor, não se sensibiliza, não chora comigo, apenas dita um rito inerte. Não percebe que não preenche nada.

Direito aos vinténs ao final do mês. 

Deste mês que não passa, que se mistura a outros meses, numa invasão perene e fria.

Em caso de gravidez, à licença paternidade, 

que vai doer, como dói um buraco sem perspectivas de fim. 

Como vai doer a inexistência de um passeio a cavalo com os netos. 

Como vai doer o som dos cavalos, calmos, com cuidado e prudência, num vazio. 

Ele não conhecerá a neta que não teve, a filha que eu não tinha à época de sua partida. Ele não perceberá como esta ausência é sentida. Não terei como dizer a ele, ainda que numa briga sincera.

Direito à privacidade,

Que eu guardo na recôndita gaveta do meu quarto,

Junto com alguns ilícitos insuspeitos, com algumas cartas e palavras dele, que agora consomem meus poemas.

Direito de ir e voltar arrependido,

Também de rir de algumas cretinas opiniões.

O luto é um espaço sensível, o corte em mim é fácil e estou num palco, suscetível.

Direito ao sigilo de minhas correspondências,

Por conveniência, beijadas com superbonder.

Quem recebeu cartas dele não entende o sigilo, suas cartas querem ser abertas, expostas, florescem.

Quem não recebeu cartas dele não entende a metamorfose. Sua caligrafia faz um amálgama com sua postura (de família) ereta, firme e doce de pai ou passarinho. Suas cartas não desligam a luz, não se ofuscam em qualquer gaveta.

Direito de resposta,

Na mesma medida do tapa. Foi ele quem me ensinou, o dedo em riste, sobre o púlpito da razão e ética, inabalável e tão frágil, meu Deus... 

Foi-se sem a minha resposta, num átimo, num segundo do tamanho do mar, ou em minutos comprimidos, inesperadamente cruéis.

Direito à grave pergunta da vida,

Torcida como um cavalo marinho. Incógnita.

A minha pergunta para a vida está num canto, repetindo a mesma frase sem sentido, falando sozinha.

E mais uma mão cheia

De direitos, direitos e direitos.

Sou um balaio destes direitos

Johnny Guimarães


46 - ABALO

 

Aqui dentro continuo em obras

Fazendo um puxadinho de entendimento
Plantando jardins nas sacadas

E também uma calha para escoar lágrimas

Vou rebocar a mentira de que digo lágrimas
Projetar uma viga firme que me sustente

Depois vou esperar pacientemente

eu

me desintegrar
Com o vento, a chuva e o sol
Ou de repente
Com um tremor sísmico
Que cisme em me derrubar daqui

Vou me despencar abraçado em alguma brisa

 

 

19/08/2022

45 - SÉRIO? SERÍSSIMO? SERÚSSO? SERIAÇO? SÉRIO-TIRANOSSAURO-REX?


      Perto da casa do menino havia uma grande obra. Como estávamos no meio da pandemia, só poderíamos agradecer muito ao prefeito por trazer esta diversão para aqui bem embaixo de nossa janela. Realmente se revelava uma ação de uma generosidade ímpar. 

Logo pela manhã, os monstros de metal já começavam seus barulhos. Eram tratores enormes, patrolas, caminhões pipas, rolos compressores e outras máquinas que nem sabíamos ensinar os nomes.  

A obra era no viaduto do complexo Carlos Drummond de Andrade e virou rotina da família, à tardezinha, paralisar o trabalho e fazer um passeio para aquele safari urbano e de ferro. O menino lindo viajava com a visão das máquinas, se empolgava, vibrava e o dia começava mais ou menos assim:

Às 7:30 h da manhã: 

- Hoje nós vamos ver a obra? Não é? Sério? Seríssimo? Serússo? Seriaço? Sério-tiranossauro-rex? 

Era o jeito dele de nos arrancar um contrato inquebrantável.

17/08/2022

44 - JACARÉ VERSUS SEU HUGO DAS SOBRINHAS

 

Fiquei sabendo que não é verdade que vovô escreveu o hino do Democrata de Sete Lagoas. Junto com os brinquedos de sucatas que ele fazia, das beliscadas de formiga que nos dava, também a memória tinha este registro. Se fosse verdade, o google diria. Não diria?

Então quero fazer justiça com o Seu Hugo e deixar seu nome voando por aqui: foi ele quem me mostrou o time certo para amar, foi ele quem nadou contra a correnteza da avançada idade e decidiu nos acompanhar até ao jogo Galo versus Democrata de Sete Lagoas, lá pelos idos de minha infância. À época, não existia o atual estádio conhecido como Arena do Jacaré (mascote do Democrata), e o campo de então quase dividia muro com a casa de meus avós.

Naquele domingo, passamos (eu e meu pai) pela roleta com o meu avô e fomos nos sentar nas arquibancadas repletas de fanáticos pelo esporte. Mal sentamos (eu já pensava no picolé de brinde) e a torcida vermelha e interiorana do democrata entoava para todos ouvirem:

- “Ahaha uhuh ô atleticano eu vou...”

E por aí foi a rima das palavras de baixo calão, desaguando nos córregos mais imundos das ofensas.

16/08/2022

43 - O QUE É DO HOMEM, BICHO NÃO COME


         Só nós três acreditávamos na apreensão da carga. O resto da equipe já tinha voltado pra casa que o mato estava fazendo mal. Alimentar-se em qualquer canto, dormir em banco de carro, no primeiro dia tem até graça, mas depois de uma semana é uma dor incômoda e o corpo parece que fica dobrado. Eu mesmo já não aguentava roçar a mão no rosto e perceber a barba irregular crescente, a ausência de uma higiene completa e demorada.

Mas estávamos com fé, apesar dos indícios desfavoráveis. 

Ao meu lado R. e M. tinham uma vontade incrível e sabíamos que agora a vitória seria ainda mais saborosa, compartilhada com poucos resilientes (para usar uma palavra que caiu no gosto e vocabulário policial).

Na verdade, tinha restado somente a zaga: 

R. é bicho de montanha, dorme em qualquer mato e parece que não percebe o frio. Se deixarem, busca a solidão com um qualquer barco em beira de rio. Hoje tem deixado uma barba grande, uma cara de mal, um verdadeiro hipster

42

 O outro é feito desta matéria gosmenta

também conhecida como eu.

 

A hora é feita desta substância que arde e passa.

 

O outro arde e fica numa colagem que suporto.

 

Sou eu e o outro no espelho.

15/08/2022

41 - MELANCOLIA – RESENHA DO FILME – SÓ LEIA SE ASSISTIR

Hoje estou esquisito e acho que é efeito do filme de Lars Von Trier. “Melancolia” ainda está ricocheteando e espero que o tiro durma um dia, seco e no alvo. Ou espero talvez que eu esteja preparado para a mensagem e que meus anticorpos da estagnação a envolvam numa ostra segura e confortável, tal como fizeram com escritores alemães e russos (sempre traduzidos), e a ponha pra dormir. Do contrário, terei que digerir o “Melancolia”, filme que ainda está aqui em queda livre.

Foi com suave maldade que me regozijei com a noiva do filme Justine (Kirsten Dunst) espatifando todas as regras de uma cerimônia de casamento cara e com hora marcada, numa fazenda com 18 buracos no campo de golfe.

Os passos atrapalhados da noiva-bailarina nos envolvia e logo nos driblava, ao ponto de ficarmos tontos em busca de uma lógica pra aquele derrame. Todos na sessão compartilharam da vontade do atraso, do deboche, do descaso, mas por um segundo apenas... foi preciso tampar os olhos e não ver a noiva-monstro colocando família, esperanças e certezas – construídas por nossos “olhos de cimento” – todas por água abaixo. A noiva troca todas as convenções e anseios por um belo e demorado banho.

14/08/2022

CRENTE

Maria

Praticante em demasia

Deixou uma torre de roupas sujas 

Alcançar os céus. 

13/08/2022

39 - RELATO SOB O OUTONO

Era quase esquina com Rua Rubem Fonseca quando um policial à paisana cruzou meu caminho. A trombada foi ligeira, mas como eu corria muito e ventava muito e muito estranhos eram meus movimentos, o policial desocupado passou a seguir-me.

Corríamos, um atrás do outro. Ele, com intuito de desvendar meus delitos; eu, buscando um ninho que me abraçasse.

Quanto mais corria, mais seus pés de homem com tempo engoliam meus segundos. De vez em quando, meus olhos lançavam olhadelas e ardiam (areavam-se), por pouco não cerrando as janelas.

12/08/2022

38 - TUDO EM ORDEM

                        Sobre o dia em que invadi o quarto do João sem aviso. 


Estava com a consciência andando de um lado para o outro e resolvi entrar no quarto dele. Comecei a arrumar gavetas, colocar as coisas em pilhas e minimizar as dobras de panos. 

Passei o aspirador de pó e comprei nova pasta de plástico, que aquela estava no fim. 

Depois do ensaio, saltei sobre os cadernos e livros. Sabia, por experiência, que são páginas marginais, muitas vezes, as últimas, algumas vezes, páginas esquecidas pelo meio da brochura, o depósito de pequenas fugas, alguns crimes e rebeliões.

11/08/2022

37 - MEDO

Começo o poema pedindo para que ouça ao fundo a música “Na hora do Almoço” de Belchior. Agora, com um volume que não atrapalhe a leitura, perceba: 


10/08/2022

36 - COSTURA


É impressionante como venho vestindo com justeza as roupas de meu falecido pai.

 

A gravata fora de moda e estrita

 

As calças que ajustam os passos

 

As camisas com desenvoltura nos punhos.

ESTOPIM

Quando você

Me chama 
Acende um sorriso


09/08/2022

34 - DONA ALBA HALLOWEEN

 


Dona Alba era uma senhora de longos cabelos brancos, que habitualmente vestia calça e blusa brancas, sapato branco e sempre ostentava uma varinha de metal nas mãos.

Descia do ônibus que chegava ao bairro por volta das seis da tarde e sempre a esperávamos, quase escondidos, prontos para o grito.

Era a Dona Alba apontar na soleira do coletivo para a turma soltar o berro:

-Dona Alba Halloween! – num bullying irresponsável.

Ela encarava a gente, falava uns impropérios, fazia diversos desenhos com a varinha no chão, e era o bastante para nos deixar morrendo de medo.

Outro menino gritava:

- Dona Alba Pomba Branca! – numa afronta desrespeitosa.

08/08/2022

33 - TEMPORAL

 

Há uma caixa plástica no quarto do João com dezenas de fotografias. Há registros de momentos de sua infância, de gambiarras de brinquedo, de passeios a cavalo, há uma roda de quadrilha barulhenta, há luzes de um jogo de videogame, há a altura da ponte do Brooklyn, os rodopios da bicicleta, o voo de pipas e uma chuva torrencial.

Os sorrisos que há na caixa de plástico do quarto do João chegam a levantar a tampa e ameaçar as prateleiras.

No meio das fotos da infância do João há também meia dúzias de fotos de minha infância. Estão perdidas por ali, fazendo uma junção de tempo impensável. Ali, de alguma forma, somos meninos, moleques contemporâneos.

32 - UM BEIJO - OLHOS DE INA


Um beijo: Snorkel
O toque: Mergulho

Noite desperta:

Snorkel

Dia se entrega: Mergulho


07/08/2022

31 - O DESCANSO DE MINHA RETINA


Creio que um velho amigo ficou louco. Ou assim aconteceu, ou, mais do que amigo meu, o desvirtuado é um grande piadista. Imaginem que agora passo remoendo meus sagrados vinte e cinco minutos no ônibus (em dias sem azar e chuva) com uma só ideia dele, do doido: que o ofício da leitura no coletivo causa o anárquico mal do deslocamento da retina.

Contesto sua ideia com força de mula. E até mesmo digo que de nada mais se trata do que simples boato de incultos.

Vinte e cinco minutos de ida, vinte e cinco minutos de volta, e lá se vão porções imensas furtadas da minha vida.

Que fazer se a própria retina clama descanso nas páginas de um bom livro?

05/08/2022

30 - UERÊ – NA LINHA DE TIRO DO GATE


Foi com o GATE – Grupamento de Ações Táticas Especiais da Polícia Militar de Minas Gerais que fizemos treinamento naqueles dias. Era época de lançamento do Tropa de Elite I, e, de alguma forma, aquele filme, ainda que não intencionalmente, mexeu com o brio da polícia.

Longe de mim dizer que este aspecto foi positivo, mas é certo que estavam todos mais alertas, dispostos ao embate e cada um querendo trazer para si alguma revolta do capitão Nascimento ou a disposição do aspirante Neto. Eram comuns sessões de polícias para ver e comentar o filme. Algumas falas épicas da película passaram, desde então, a fazer parte da gíria operacional.

Foi neste contexto que eu me vi naquela linha de tiro, num estande, empolgado, treinando o manuseio e disparo de fuzis. Sim, fuzis de verdade, como no filme.

Difícil me ver poeta e fuzileiro ao mesmo tempo?

04/08/2022

29 - TORTO ARADO


Assim como uma faca

que sem bolso ou bainha

se transformasse em parte

de vossa anatomia

João Cabral


          O livro Torto Arado (2019) de Itamar Vieira Júnior me tomou como a um cavalo.

O livro de início me marcou pelo ritmo da trama, quando de um só fôlego já me descobri numa magia intensa de uma sôfrega leitura. Capítulos iniciais feitos de sangue e faca. A sensação é de perceber o gosto quente de cada cena. Na verdade, a intensidade do livro é da capa ao fim. Também é da capa ao fim o registro da luta de uma comunidade quilombola pelo direito à existência digna, a um teto firme sobre a cabeça e a um pedaço de terra sob os pés, ao fruto de seu trabalho.

         O livro situa o leitor num cenário onde a vida é vivida por uma família sem garantias. Uma comunidade riquíssima de encantos, suores e dores, sem o menor título de propriedade. Os poucos pertences que restam vão sendo usurpados pelo braço do patrão branco página por página, até o último bem de valor, material ou imaterial (até mesmo a crença e a possibilidade de sepultamento são vilipendiados).

03/08/2022

28 - PÉ DE BICHO - JOGO DE PALAVRAS

 Aquele pé de manga estava repleto de

MORCEGOS!

Fui obrigado a chamar os bombeiros. Eles trouxeram uma escada e subiram com capacetes. Lá chegando, espantaram os morcegos que voaram e voaram e voaram um voo medonho.

Quando os bombeiros foram embora, aquele pé de manga ficou repleto de

MORCEGOS!

Fui obrigado a chamar novamente os bombeiros. Eles trouxeram a mesma escada, subiram com capacetes e espantaram os mesmos morcegos que voaram e voaram e voaram um voo medonho.

Mostrei também para os bombeiros que agora aquele coqueiro estava repleto de

ABELHAS!

Os bombeiros arredaram a escada, subiram com proteção e também espantaram as abelhas que zumbiram e zumbiram e zumbiram um zumbido nervoso.

Quando os bombeiros foram embora, aquele pé de manga ficou repleto de

MORCEGOS!

Quando os bombeiros foram embora, aquele coqueiro ficou repleto de

ABELHAS!

Fui obrigado a chamar novamente os bombeiros...

 

02/08/2022

27 - PONTO DE VISTA

 

O que é Ponto de vista? Vou te explicar:

 

Fiz um laboratório, no canto da sala

Com copos, tralhas e ninharia

Misturei água e poções mágicas.

Da alquimia,

Os adultos só viram a casa ensopada.

01/08/2022

26 - CONTA UMA HISTORINHA?

 

Os meninos sempre pediam, antes de dormir, uma historinha de cabeça. Era o jeito deles dizerem que queriam uma história original, que não viesse de livro nenhum, que fosse feita ali mesmo, na frente deles, de improviso, quentinha, saindo na hora.

- Conta uma historinha? Mas tem que ser de cabeça!

E o pai contava e lá pelo meio da história, quase sempre, o sono batia, e as palavras se embaralhavam, e a história que falava sobre o peixinho que lutava, de repente, trazia frases desconexas, soltas, como “o combustível acabou”, aí o peixinho “o engarrafamento me fez atrasar”, “cinto de segurança”, “pega a caneta” etc. Os meninos riam da doidura momentânea do pai e o sacolejavam o lé-lé da cuca para tirá-lo daquela soneca.

- Conta uma historinha? Mas tem que ser de cabeça! Grandona, que essa foi pequenininha.